Hoje dei por mim à porta da primeira casa onde vivi em Lisboa. Tinha 17
anos, estava sozinha, as ruas eram-me estranhas e a cidade parecia
disposta a obrigar-me a desistir. Chegava a casa e ela estava vazia.
Chorei noites a fio, sem ninguém com quem pudesse partilhar nem as
novidades nem os medos, ninguém a dizer-me que desistir não era uma
opção. Não conhecia ninguém e naquela altura não fazia amigos
facilmente. Vim sozinha com sonhos no bolso e poucos meios de os
concretizar. E trouxe facturas, que ainda pago em prestações. 12 anos
depois, concretizei alguns sonhos e as prestações das facturas ainda não
acabaram. Tive um momento estranho à porta da minha primeira casa em
Lisboa, que foi a mais solitária das muitas que já tive. Desistir não
foi uma opção a que me desse. Aos 29 anos, com todas as voltas que a
vida deu entretanto, há uma linha comum entre a miudeca de 17 anos e a
de 29: defendo de pé e com dignidade aquilo em que acredito, mesmo que
muitas vezes dê por mim, de pé, sozinha. E apenas para isto o passado me
serve, para quando a vida me empurra para o chão olhar para trás e
saber que me sei levantar. Fico de pé.