Não é não saberes como vais pagar a casa este mês nem sequer não fazeres ideia de como vai ser o amanhã. Não é tentares desenhar em esquiços um futuro que te foge a cada passo que dás em frente, quer corras quer vás devagar. Não é teres a responsabilidade de toda a tua vida nas costas sem margem para erro. Não é a impotência de não poderes controlar o tempo. Não é não te lembrares a que sabe um beijo ou nem querer chegares a casa e teres que lidar com o peso do silêncio. Não é, ouve o que te digo, ou lê o que te escrevo: o maior pontapé que podes levar da própria vida, não é teres que engolir que foste fraco. Que não lutaste o que podias. Que não deste tudo, que falhaste, que tentaste, porque pelo menos tentaste. Não é que escolheste um ou outro caminho e que muitas vezes podes ter ido pelo mais fácil ou pelo mais errado. Não é que que escondeste ou que te deste cedo demais. Não é ouvir que não és amada por quem amas. Não é teres que começar sempre tudo de novo. Não é teres que fazer sozinha o que uma família devia ter feito contigo. Não é teres que aprender a perdoar a quem te fez o imperdoável. Não é teres que te reconstruir a cada vez que a vida te atira ao chão. Não é teres que te esquecer da tua infância miserável e aprenderes a admirar as gargalhadas das outras crianças. Não é roubarem-te uma vida na qual apostaste tudo. Não é sequer teres que aprender a lidar com uma traição. Atenta: o maior pontapé que podes levar na vida vai-te directo ao coração. É um coice nas entranhas. O maior pontapé que podes levar na vida é quando te dizem que apesar de tudo, e o tudo deixou-te vazia de tudo o que tinhas para dar sem reservas, que apesar de tudo não bastas. Que tudo o que és não basta. Que tudo o que és e que faz de ti uma pessoa única, porque todos somos únicos pelo que somos por dentro, não é o que é preciso para fazer a pessoa que mais amas no mundo amar-te na mesma medida. É este coice no coração, este esventrar de entranhas, que é o maior pontapé que podes levar na vida.