ele não usa maiúsculas e eu abuso na repetição da palavra chave do texto que escrevo. não vou usar maiúsculas. não que me esteja a comparar a ele, um escritor extraordinário. eu precisaria de vidas e vidas para lhe chegar aos calcanhares. é muito raro escrever alguma coisa no blogue te tenha a ver com o meu trabalho. nenhuma regra mo impede, mas este espaço é pessoal. quero contar-vos, a quem ainda por aqui passa, um fim de tarde com um dos meus escritores preferidos. não é só a sua escrita que admiro, é o homem. admiro a sua versatilidade de deixar o nome e cunho em várias áreas, gosto que sendo tão tímido se meta à prova ao ponto de lhe chamarem um excelente comunicador.
Era fim de tarde e o sol caía sobre lisboa, fiz questão de escolher um sítio bonito para fazer a entrevista e as fotos, fotos que nunca pensei ter coragem para lhe pedir que fossem feitas daquela maneira, disse logo que sim. "vocês foram dos mais malucos que encontrei até agora", disse com um sorriso. ficámos só os dois no fim para a entrevista. bem, o que deveria ter sido uma entrevista foi uma conversa de gravador ligado, uma discussão sobre o sentido da vida e um acenar de cabeça um ao outro que o gravador não consegue captar. "quem não ama não é boa pessoa", disse-me já com uns raios avermelhados nos olhos como quem está a reforçar uma regra da sua vida ou dá um conselho que com ganas espere que seja levado a sério. um alternar entre tímido e amigo, entre o sublinhar do que já sabe da vida e um esconder de medos. uma conversa com o gravador ligado. Assim que passámos para o
off, mais conversa. uma desta vez sem ganho para nenhum dos dois, em máscaras, sem qualquer vantagem para o leitor, para o escritor, para a editora, para a revista ou para a jornalista. entre a surpresa de eu saber tanto sobre ele à leitura que me fez em minutos. partilhas breves de memórias de infância que são comuns apesar da diferença de idade. os mesmo medos. as mesmas teimas. "
vejo que já tem consigo o livro", disse-me. agradeceu-me a entrevista, eu agradeci-lhe a conversa. sorrimos-nos. rabiscou num papel o endereço de mail pessoal e o número de telemóvel. escreveu-me ainda umas linhas como dedicatória no livro, li apenas quando cheguei ao carro. acendi um cigarro e não evitei deixar cair umas putas de umas lágrimas que estavam mesmo ali escondidas à espera de um motivo para saltarem. um desconhecido leu-me em apenas uns minutos e fez questão de mo mostrar naquela dedicatória. apanhou-me ali a única regra que tenho na vida. acreditem, não sou eu que sou óbvia, é ele que é extraordinário. há pessoas extraordinárias e a cada vez que tenho a honra de conhecer uma ganho mais um bocadinho de fé na humanidade, e em mim. obrigada valter hugo mãe.